"Santas as visões, santas as alucinações, santos os milagres, santo o globo ocular, santo o abismo." (Allen Ginsberg)

29.9.10

Mobília Mínima

A poesia é uma comunidade intelectual falida?
imagem questão . Tiny Furniture, de Rena Dunham, EUA, 2010

24.9.10

Lila Diz

Ela é um planeta em movimento irregular, uma Ferrari abandonada num lixão. O mundo pára. O dia, a noite, as guerras, as estações. Você apenas obedece. texto & movimento . Lila Dit Ça, de Ziad Doueiri, França/Inglaterra, 2004

11.9.10

Persona

Não, não pretendo falar do filme de Bergman. Também emudeci ao sentir o dilaceramento de culpa de uma mulher que odeia seu filho, e por quem este sente um grande amor. A mudez que a mulher escolheu para viver a sua culpa: não quis falar, o que aliviria o seu sofrimento, mas calar-se para sempre como castigo. Nem quero falar da enfermeira que, se a princípio tinha a vida assegurada pelo futuro marido e filhos, absorve no entanto a personalidade da que escolhera o silêncio, transforma-se numa mulher que não quer nada e quer tudo – e o nada o que é? e o tudo o que é? Sei, oh sei que a humanidade se extravasou desde que apareceu o primeiro homem. Sei que a mudez, se não diz nada, pelo menos não mente, enquanto as palavras dizem o que não quero dizer. Também não vou chamar Bergman de genial. Nós, sim, é que não somos geniais. Nós que não soubemos nos apossar da única coisa completa que nos é dada ao nascimento: o gênio da vida. Vou falar da palavra pessoa, que persona lembra. Acho que aprendi o que vou contar com meu pai. Quando elogiavam demais alguém, ele resumia sóbrio e calmo: é, ele é uma pessoa. Até hoje digo, como se fosse o máximo que se pode dizer de alguém que venceu numa luta, e digo com o coração orgulhoso de pertencer à humanidade: ele, ele é um homem. Obrigada por ter desde cedo me ensinado a distinguir entre os que realmente nascem, vivem e morrem, daqueles que, como gente, não são pessoas. Persona. Tenho pouca memória, por isso já não sei se era no antigo teatro grego que os atores, antes de entrar em cena, pregavam ao rosto uma máscara que representava pela expressão o que o papel de cada um deles iria exprimir. Bem sei que uma das qualidades de um ator está nas mutações sensíveis de seu rosto, e que a máscara as esconde. Por que então me agrada tanto a idéia de atores entrarem no palco sem rosto próprio? Quem sabe , eu acho que a máscara é um dar-se tão importante quanto o dar-se pela dor do rosto. Inclusive os adolescentes, estes que são puro rosto, à medida que vão vivendo fabricam a própria máscara. E com muita dor. Porque saber que de então em diante se vai passar a representar um papel é uma surpresa amedrontadora. É a liberdade horrível de não ser. E a hora da escolha. Mesmo sem ser atriz nem ter pertencido ao teatro grego – uso uma máscara. Aquela mesma que nos partos de adolescência se escolhe para não se ficar desnudo para o resto da luta. Não, não é que se faça mal em deixar o próprio rosto exposto à sensibilidade. Mas é que esse rosto que estava nu poderia, ao ferir-se, fechar-se sozinho em súbita máscara involuntária e terrível. É, pois, menos perigoso escolher sozinho ser uma pessoa. Escolher a própria máscara é o primeiro gesto voluntário humano. E solitário. Mas quando enfim se afivela a máscara daquilo que se escolheu para representar-se e representar o mundo, o corpo ganha uma nova firmeza, a cabeça ergue-se altiva como a de quem superou um obstáculo. A pessoa é. Se bem que pode acontecer uma coisa que me humilha contar. É que depois de anos de verdadeiro sucesso com a máscara, de repente – ah, menos que de repente, por causa de um olhar passageiro ou uma palavra ouvida – de repente a máscara de guerra de vida cresta-se toda no rosto como lama seca, e os pedaços irregulares caem como um ruído oco no chão. Eis o rosto agora nu, maduro, sensível quando já não era mais para ser. E ele chora em silêncio para não morrer. Pois nessa certeza sou implacável: este ser morrerá. A menos que renasça até que dele se possa dizer “esta é uma pessoa”. Como pessoa teve que passar pelo caminho de Cristo. texto . Persona, de Clarice Lispector imagem . Kinematografi, de Ingmar Bergman, Suécia, 1966

10.9.10

Meu Amigo Cláudia

"Cláudia é uma das pessoas mais dignas que conheço. E aqui preciso deter-me um pouco para explicar o que significa, para mim, “digno” ou “dignidade”. Nem é tão complicado: dignidade acontece quando se é inteiro. Mas o que quer dizer ser “inteiro”? Talvez, quando se faz exatamente o que se quer fazer, do jeito que se quer fazer, da melhor maneira possível." imagem . Meu Amigo Cláudia, de Dácio Pinheiro, Brazil, 2009 texto . Caio Fernando Abreu no conto Meu Amigo Cláudia

9.9.10

Cartas do Deserto (Elogio à Lentidão)

Entregar cartas de casa em casa. Em cada envelope uma esperança. Que às vezes se desfaz - notícia de morte. Que outrora se refaz - reza que deus manda a pensão. Simão de Ray Ban no deserto. Cartas demoram mais a chegar e custam mais caro do que SMS. Mas o preço aparentemente mais barato pode ser mais alto do que se imagina. Perder a graça da espera pode não ser uma evolução. Tudo rápido demais pode ser uma desventura irreversível. Como desacelerar sem pifar? Como ter o olhar mais virgem sendo bombardeado continuamente por tanta informação inútil? Retardar as coisas para que elas façam mais sentido - ser a rampa que abriga o skate vazio e o corpo do skatista caido no chão. Ser chuveiro antes de chacina. Mover-se na vida com a mesma delicadeza de gestos dum ator num filme mudo. Lentidão significa leveza, alteza. Maior sabedoria. Viver de contemplação. Voar sem medir tanto os passos, sem olhar tanto o relógio. Além do outdoor e das exigências do mercado, além da nuvem negra salpicando o céu azul e amarelo, passarinhos cantam sobre as antenas de câncer da telefonia celular. E se depender de mim, cantarão cada vez mais alto. texto . matheus matheus com alusões à Waly Salomão, Gus Van Sant, Humberto Gessinger e Luis Buñuel imagem . Letters from the Desert (Elougy to Slowness, de Michela Occhipinti, Itália/Índia, 2010

7.9.10

Exílios

legenda & imagens . Exils, de Tony Gatlif, Japão/França, 2004

3.9.10

Homens Que Encaravam Cabras

"Sua sensibilidade é sua força." imagem & texto . The Men Who Stare at Goats, de Grant Heslov, USA, 2009

1.9.10

Opium

"O seu nível de inteligência é, sem dúvida, baixo. Seu estado é medianamente grave. Mas em seus escritos há uma força incomum e inexplicável. Sua paixão ao colocar o que pensa no papel é invejável." imagem & texto . Ópium: Egy elmebeteg nö naplója, de Janos Szász, Hungria/Alemanha/USA, 2007