"Santas as visões, santas as alucinações, santos os milagres, santo o globo ocular, santo o abismo." (Allen Ginsberg)

25.5.10

Adverso

Querido, eu te fiz mal? Eu te fiz... Eu te fiz... Eu te fiz em mim. E agora você? E agora eu? Agora eu não me sou. Não sou eu. Não eu. Eu me renego. Não, não sinto nada. O que será digno do meu merecimento? Qual destino? Qual balada? Qual morte? De ti eu me fiz e te fiz em mim. E nós dois fomos dois juntos. Mas os outros não poderiam suportar e não ficaram quietos. Vieram. Levaram o que eu/você guardamos com tanto carinho, o que olhávamos por horas sem medo e sem tristeza. E tudo de muito bonito eles transformaram em lixo. Não. Não deixei de ser você. Mas como agora não sou nada para mim, você também não é. Não sou. Não é. texto . Matheus Matheus, Sem Palavras 24 imagem . Oscar Wilde e Alfred Douglas

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11.5.10

Fale Com Ela

Coincidências aos montes. Homenagens também. Há destino? Nem sei. O mundo não é pequeno mas, com certeza, está sempre em movimento. Somos obrigados a nos movimentar. Mesmo quando achamos que estamos parados, nos movimentamos com o mundo, nesse nosso pequenino pedaço de universo. Escrever seria como falar com alguém que, achamos, não nos pode escutar, por não poder responder? Ainda assim, falo. Aqui, ali, em qualquer lugar. Por pura e irritante insistência. Por buscar beleza e leveza também. E, sobretudo, por necessidade. Na espera, não há esperança, de que quem me ouve submerja lentamente deste sono pesado e acorde para um outro tipo de sonho, mais leve: o limiar do que chamam de real. O movimento - a expressão do movimento. As palavras - a falta de palavras. As coisas que não aceitamos, com as quais não concordamos. E, no entanto, não podemos deixar de admitir: elas existem independentes de nossa vontade. Aquele que deu seu amor, crescente, chamou, por bem ou por mal, de volta à vida a sua amada. Um outro, que se recusou, primeiro a escutá-la pelo hábito de deixá-la sempre ouvir, depois a falar com ela por não ter certeza de que ela o ouvia, minguou, morreu, mais nada. texto . matheus matheus imagem . Hable Con Ella, de Pedro Almodóvar, Espanha, 2002

7.5.10

O Retrato de Dorian Gray

O artista é o criador das coisas belas. Revelar a arte e ocultar o artista é a finalidade da arte. O crítico é aquele que pode traduzir, de um modo diferente ou por um novo processo, a sua impressão das coisas belas. A mais elevada, como a mais baixa, das formas de crítica é uma espécie de autobiografia. Os que encontram significações feias em coisas belas são corruptos sem ser encantadores. Isso é um defeito. Os que encontram belas significações em coisas belas são cultos. Para estes há esperança. Existem os eleitos, para os quais as coisas belas significam unicamente a Beleza. Um livro não é, de modo algum, moral ou imoral. Os livros são bem ou mal escritos. Eis tudo. A aversão do século XIX ao Realismo é a cólera de Calibã por ver o seu rosto num espelho. A aversão do século XIX ao Romantismo é a cólera de Calibã por não ver o seu próprio rosto num espelho. A vida moral do homem faz parte do tema para o artista, mas a moralidade da arte consiste no uso perfeito de um meio imperfeito. O artista nada deseja provar. Até as coisas verdadeiras podem ser provadas. Nenhum artista tem simpatias éticas. A simpatia ética num artista constitui um maneirismo de estilo imperdoável. O artista jamais é mórbido. O artista tudo pode exprimir. Pensamento e linguagem são para o artista instrumentos de uma arte. Vício e virtude são para o artista materiais para uma arte. Do ponto de vista da forma, o modelo de todas as artes é a do músico. Do ponto de vista do sentimento, é a profissão do ator. Toda arte é, ao mesmo tempo, superfície e símbolo. Os que buscam sob a superfície fazem-no por seu próprio risco. Os que procuram decifrar o símbolo correm também seu próprio risco. Na realidade, a arte reflete o espectador e não a vida. A divergência de opiniões sobre uma obra de arte indica que a obra é nova, complexa e vital. Quando os críticos divergem, o artista está de acordo consigo mesmo. Podemos perdoar a um homem por haver feito uma coisa útil, contanto que não a admire. A única desculpa de haver feito uma coisa inútil é admirá-la intensamente. Toda arte é completamente inútil. imagem . The Picture of Dorian Gray, de Albert Lewin, EUA, 1945 texto . The Picture of Dorian Gray, de Oscar Wilde, introdução

5.5.10

Garotos Incríveis

"Boas influências não existem, senhor Gray. Toda influência é imoral. Porque o objetivo da vida é o auto-desenvolvimento, a percepção perfeita da própria natureza. Estamos aqui para isso. Devemos viver a vida sem limites, dar forma a todo sentimento e tornar realidade todo sonho. Para se livrar da tentação você deve se render a ela. Resista, e a alma ficará doente pelo desejo do que é proibido." imagem . Wonder Boys, de Curtis Hanson, EUA, 2000 texto . The Picture of Dorian Gray, de Albert Lewin, EUA, 1945